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Obras de José de Alencar (continuação)

Diva (1864) - dando continuidade às cartas para a senhora G. M., agora Paulo conta a história de amor entre seu amigo, o Dr. Augusto Amaral, e a jovem Emília. Paulo e Augusto se conheceram a bordo de um navio rumo ao Recife: enquanto Paulo permanecera em sua cidade natal, o outro, jovem médico, partira para Paris e lhe enviara um manuscrito, confessando ao amigo o amor pela moça, cujo conteúdo é o romance que se segue.

Emília é uma menina feia que cresce em meio ao luxo das grandes famílias ricas do Rio de Janeiro. Porém, quando muito jovem, contrai uma doença mas é salva pelo dr. Amaral. Dois anos mais tarde, depois de sua viagem, o jovem médico retorna à casa a convite de seu pai mas a mnina, agora uma bela moça, o ignora e mostra desdém.

Por "diva", compreende-se uma mulher que é muito bonita e altiva, com ares de divindade e superioridade e que é assim vista por seus admiradores. O título do romance é explicado a partir da descrição que o narrador (Augusto) faz de Emília:

Era alta e esbelta. Tinha um desses talhes flexíveis e lançados, que são hastes de lírio para o rosto gentil; porém na mesma delicadez do porte esculpiam-se os contornos mais graciosos com firme nitidez das linhas e uma deliciosa suavidade nos relevos.

Não era alva, também não era morena. Tinha sua tez a cor das pétalas da magnólia, quando vão desfalecendo ao beijo do sol. Mimosa cor de mulher, se a aveluda a pubescência juvenil, e a luz coa pelo fino tecido, e um sangue puro a escumilha de róseo matiz. A dela era assim.

Uma altivez de rainha cingia-lhe a fronte, como diadema cintilado na cabeça de um anjo. Hava em toda a sua pessoa um quer que fosse de sublime e excelso que a abstraía da terra. Contemplando-a naquele instante de enlevo, dir-se-ia que ela se preparava para sua celeste ascenção.

Mais adiante:

Por esse tempo Emília fez a sua entrada no Cassimo.
- Já viu a rainha do baile? disseram-me logo que cheguei.
- Ainda não. Quem é?
- A Duartezinha.
- Ah!
Realmente, a soberania da formosura e elegância, ela a tinha conquistado. Parecia que essa menina se guardara até aquele instante, para de improviso e no mais fidalgo salão da corte fazer sua brilhante metamorfose. Nessa noite ela quis ostentar-se deusa; e vestiu os fulgores da beleza, que desde então arrastavam após si a admiração geral.

O romance passa a maior parte do tempo mostrando os "jogos" e conflitos entre os dois personagens e o esforço da parte de Augusto em compreender os motivos da atitude ríspida de Emília e meios para se aproximar da moça, por quem está muito interessado. Ao final do romance, Augusto declara seu amor por Emília, que diz não o amar. Porém, a moça se arrepende do que havia dito e assume que, na verdade, a paixão que ele sente por ela é recíproca. Ela então se rende ao amor que sente por ele e os dois ficam juntos.

O enredo denota as principais caracteristicas dos romancs urbanos de Alencar: um enredo simples, porém, com personagens psicologicamente mais elabordos do que os vistos até então na literatura brasileira. A descrição dos costumes da alta sociedade e da corte, do que se passava dentro dos salões e da intimidade das alcovas das senhoras munido de um vocabulário rebuscado fez de Alencar um escritor singular em seu tempo.

Curiosidade: No prólogo do romance, José de Alencar discursa sobre a produção de suas obras de acordo com o estilo utilizado. Ele havia recebido críticas acerca da composição por esta ser excessivamente composta por "galicismos". O autor discorda e afirma que, como defensor de uma língua em constante evolução, em oposição a um exagerado clacissismo, que em nada contribuiria para o desenvolvimento da língua na literatura. Com relação à "influência" do idioma estrangeiro, Alencar diz:

Sem o arremedo vil da locução alheia e a limitação torpe dos idioma estrangeiros,, devem as línguas aceitar algumas novas maneiras de dizer, graciosas e elegantes, que não repugnem ao seu gênio e organismo.

Logo, Alencar estava começando a defender um novo idioma falado e escrito no país que naturalmente se diferenciaria daquele falado no outro continente.

Saiba mais:

galicismo: utilização de palavras e/ou expressões de origem francesa.

clacissismo: utilização do estilo clássico nas artes, música, arquitetura e escultura.


Jardim com flores (1891), pintura de Belmiro de Almeida

Senhora (1875) - um dos romances mais conhecidos de Alencar, agora o narrador conta uma história aos leitores, não sendo mais Paulo (o narrador dos dois livros anteriores) quem assume a voz narrativa. Já no prólogo, há uma nota informando seus leitores de que os fatos contidos no romance tratam de uma história verídica a ele narrada.

Senhora conta a história de amor entre Aurélia Camargo, uma moça pobre e orfã que se apaixona pelo belo Fernando Seixas. Os dois noivam, porém, o moço se desilude por ela ser pobre e por ter esperanças de encontrar uma moça mais rica e, assim, faturar um dote significativo.

Inesperadamente, o avô de Aurélia falece, deixando para a moça uma vultosa herança transformando a moça antes pobre em uma das mais ricas mulheres da corte. A partir daí, Aurélia maquina um plano para se vingar de Fernando: por meio de seu tutor, o Sr. Lemos, ela manda uma proposta de casamento "anônima" a Fernando, oferecendo cem contos de réis (soma grandiosa para a aquela época). O moço, ambicioso e em péssimas condições financeiras, aceita a proposta, sem saber a identidade da noiva misteriosa.

No dia do casamento, quando o mistério é então resolvido, e os noivos se encontram, Aurélia anuncia que os dois viverão em aposentos separados e que aparecerão juntos apenas em público, para a sociedade. Fernando se arrepende da sua decisão e da sua leviandade e junta, com muito esforço, a soma anteriormente paga pelo dote e propõe a separação.

Apesar de conflituoso, o breve casamento uniu os dois personagens que, através da experiência, puderam amadurecer suas ideias sobre o amor e os sentimentos que nutriam um pelo outro. Por fim, os dois se reconciliam e conseguem resolver as diferenças. Novamente, temos um final feliz para um romance de Alencar.

Dividido em quatro partes: O Preço, Quitação, Posse e Resgate, a narrativa não segue uma ordem cronológica.

A primeira parte retrata os eventos em um tempo presente à narrativa, isto é, a apresentação de Aurélia na sociedade, a proposta de casamento à Fernando e a noite de núpcias, ao passo que Quitação trata do passado dos dois personagens.

Em Poss, temos novamente o tempo presente da narrativa e os principais conflitos entre os personagens. O amadurecimento de ambos e o gradual arrependimento de Fernando são as principais características dessa parte. Por fim, em Resgate, um ano após o casamento, Fernando entrega a Aurélia a soma correspondente ao valor do dote e propõe a separação. No entanto, Aurélia confessa que deixou toda sua fortuna como herança para Fernando.

A narrativa é em terceira pessoa e acompanha o enredo do ponto de vista do que acontece com Aurélia. Isto é, há um desenvolvimento psicológico da personagem ao mesmo tempo em que ela é idealizada pelo narrador.

O romance reflete as intenções de uma elite carioca, na figura de Fernando Seixas, que via o casamento como moeda de troca para a ascenção social. Enquanto a moça chora o amor perdido, o rapaz vai em busca de dinheiro fácil e que valoriza apenas as aparências. Alguns críticos consideram o romance como um dos precursores do realismo, que viria a ser desenvolvido em nossa literatura por Machado de Assis, ao questionar os valores da sociedade da época e dos casamentos motivados por interesse.

Segundo o crítico José de Nicola, o romance revela um confronto entre a velha sociedade de Alencar, aristocrática e rural, e a emergente sociedade burguesa, de comerciantes e capitalistas, que firmava raízes no Rio de Janeiro.

Saiba mais:

dote: é uma soma em dinheiro ou bens que a família da noiva dava ao noivo na ocasião do casamento. Era um meio de assegurar que a nova família possuísse meios para se sustentar até que o marido conseguisse uma fonte de renda ou que a família recebesse suas partes na herança.

conto de réis: moeda corrente no Brasil no século XIX.


A atriz Antônia Marzullo em peça baseada no romance Senhora (1942)

Os clichês do romantismo aparecem em peso nesse romance: o pesar com a perda do amor, a fortuna inesperada, o mistério, a redenção, o arrependimento e o final feliz com o casamento dos personagens principais.

Por fim, o romance é considerado um dos mais interessantes da literatura brasileira pela estrutura narrativa, pela crítica que faz à sociedade burguesa e pelo próprio enredo, que se destaca das demais obras até então produzidas no Brasil.

Como referenciar: "Obras de José de Alencar - Diva (1864) e Senhora (1875)" em Só Literatura. Virtuous Tecnologia da Informação, 2007-2024. Consultado em 28/03/2024 às 09:54. Disponível na Internet em http://www.soliteratura.com.br/romantismo/romantismo14.php