Autores modernistas da segunda fase (continuação)
Murilo Mendes
Murilo Monteiro Mendes nasceu na cidade de Juiz de Fora, em Minas Gerais, no ano de 1901. Foi poeta, prosador e crítico de artes plásticas. Aos 16 anos, fugiu do colégio onde estudava para assistir, no Rio de Janeiro, à apresentação do bailarino e coreógrafo russo Vaslav Nijinski (1890 - 1950).
Em 1920, recusa-se a dar continuidade aos estudos e, após inúmeras tentativas da família de arrumar-lhe um emprego, vai com o irmão mais velho para o Rio de Janeiro. Entre os anos de 1924 e 1929, escreveu para as primeiras publicações modernistas, como a Revista de Antropofagia, de São Paulo, e a Verde, de Cataguases, Minas Gerais.
Murilo Mendes, Juiz de Fora (MG) 1901 – 1975
Revista de Antropofagia
Com o auxílio financeiro do pai, publicou seu primeiro livro, Poemas, em 1930, pelo qual recebeu o Prêmio Graça Aranha. Murilo Mendes converteu-se ao catolicismo após a morte do amigo pintor, filósofo e poeta Ismael Nery (1900 - 1934).
Obra Poemas
No ano de 1940, casou-se com a poeta Maria da Saudade Cortesão, filha do poeta e historiador português Jaime Cortesão (1884 - 1960), exilado no Brasil por não concordar com a ditadura de Antonio Oliveira Salazar (1889 - 1970).
Murilo Mendes e a esposa Maria da Saudade Cortesão Mendes
Ao final de sua estadia na Europa, entre os anos de 1952 e 1956, em missão cultural, fixou residência na Itália e passou a lecionar cultura brasileira na Universidade de Roma.
Murilo Mendes em missão cultural pela Europa
Seu apartamento, situado no centro da capital italiana, tornou-se ponto de referência para escritores e artistas plásticos europeus, que o ajudam a compor um respeitável acervo de arte contemporânea, que atualmente pertence ao Museu Murilo Mendes, em Juiz de Fora, Minas Gerais.
Murilo Mendes com as obras que formam o acervo de artes visuais do museu que leva o seu nome (MAMM)
No ano de 1972, recebeu o prêmio internacional de poesia Etna-Taormina, na Itália. Morreu em Lisboa, Portugal, no ano de 1975.
Principais obras
Poesia: Poemas (1930); História da Brasil (1932); Tempo e Eternidade (1935) [em contribuição com Jorge de Lima]; A Poesia em Pânico (1938); O Visionário (1941); As Metamorfoses (1944); Mundo Enigma (1945); Poesia Liberdade (1947); Janela do Caos (1949); Contemplação de Ouro Preto (1954); Poesias (1925-1955); Siciliana (1959); Tempo Espanhol (1959); Antologia Poética (1964); Convergência (1970).
Obra Mundo Enigma
Prosa: O Discípulo de Emaús (1944); Na Idade do Serrote (1968) - memórias.
Obra O Discípulo de Emaús
Vale a pena saber mais:
Na trajetória poética de Murilo Mendes, é possível perceber inicialmente uma visão irônica e satírica, ao estilo da primeira fase do Modernismo, em História do Brasil, obra de 1932. Seus textos utilizam o humor e ironia como instrumento crítico.
Observe a definição irreverente do que chamou o Homo brasiliensis:
"O homem
É o único animal que joga no bicho".
Obra História do Brasil
Nos posteriores, evolui para a tendência espiritualista de Tempo e eternidade, de 1935, composto em parceria com Jorge de Lima, onde revela um homem angustiado diante do bem e do mal.
Obra Tempo e eternidade
Observe:
A anunciação
O anjo pousa de leve
No quarto onde a moça pura
Remenda a roupa dos pobres.
Nasceu uma claridade
Naquele quarto modesto:
A máquina de costurar
Costura raios de luz;
Não se sabe mais se o anjo
É ele mesmo, ou Maria.
[...]
Na obra O visionário, de 1941, Murilo Mendes escreve poemas que utilizam técnicas surrealistas.
Obra O visionário
Obrserve:
Pré-história
Mamãe vestida de rendas
Tocava piano no caos.
Uma noite abriu as asas
Cansada de tanto som,
Equilibrou-se no azul,
De tonta não mais olhou
Para mim, para ninguém!
Cai no álbum de retratos.
Nas obras Mundo enigma, de 1945, e Poesia liberdade, de 1947, destacam-se os poemas sociopolíticos que refletem a realidade da Segunda Guerra Mundial. Obrserve:
Perturbação
Desta varanda se descortina o mar noturno
Poderoso.
Entretanto existe alguém mais forte ainda
carregando conchas de mortos.
O fantasma mecânico da guerra
Que passa
Com seu penacho de fumaça e sangue.
Em outras obras do poeta, é possível encontrar a obsessão pelo caos, a presença do eterno-feminino, em conflito entre o profano e o sagrado. Outras características de Murilo Mendes são a exatidão métrica, o respeito à semântica, o emprego de séries compactas de nomes e verbos, encontrados em Contemplação de Outro Preto (1954). Observe:
Montanhas de Ouro Preto
Desdobram-se as montanhas de Ouro Preto
Na perfurada luz, em plano austero.
Montes contempladores, circunscritos,
Entre cinza e castanho, o olhar domado
Recolhe vosso espectro permanente.
Por igual pascentais a luz difusa
Que se reajusta ao corpo das igrejas,
E volve o pensamento à descoberta
De uma luta antiqüíssima com o caos,
De uma reinvenção dos elementos
Pela força de um culto ora perdido,
Relíquias de dureza e de doutrina,
Rude apetite dessa cousa eterna
Retida na estrutura de Ouro Preto.
Retrato de Murilo Mendes, por Guignard